Os agentes de Inteligência Artificial (IA) deixaram de ser uma curiosidade experimental para virar pauta central de estratégia das seguradoras. No ITC Las Vegas deste ano, essa constatação não se tratava apenas de demonstrações pontuais: os corredores e painéis evidenciaram uma proliferação de soluções que prometem, ao mesmo tempo, ganho de produtividade e um redesenho das etapas mais operacionais do ciclo do seguro – com destaque para subscrição (underwriting) e gestão de sinistros.
A cena não é surpresa isolada: consultorias e players do mercado vêm apontando que os modelos de IA estão expandindo sua capacidade operacional e as empresas que liderarem essa integração tendem a colher ganhos de eficiência e competitividade no mercado. E, neste sentido, uma das conversas recorrentes é sobre até que ponto as novas tecnologias substituirão pessoas.
No ITC ouviu-se um consenso pragmático: o objetivo imediato dos agentes não é eliminar profissionais, mas transformar o tempo que eles dedicam a tarefas repetitivas em trabalho de maior valor. Na subscrição patrimonial, por exemplo, soluções combinando imagens (capturadas através de drones) e modelagem de risco que observam características do imóvel e comportamentos do segurado já permitem automatizar etapas de avaliação que antes levavam dias. O efeito direto é reduzir as despesas administrativas e acelerar decisões, sem, necessariamente, delegar ao algoritmo todas as decisões finais. Essa é a mesma abordagem adotada por estudos que mapeiam processos buscando automações visando melhorias e ganhos de eficiência.
No âmbito de sinistros, a atuação de agentes também se destaca. Soluções que verificam a autenticidade de imagens, correlacionam informações e validam documentos têm potencial para agilizar tanto a abertura quanto a liquidação dos eventos, ao mesmo tempo em que reduzem fraudes e minimizam atritos na experiência do usuário, contribuindo para preservar indicadores como NPS e retenção. Ademais, casos recentes apontam que resultados expressivos podem ser obtidos com a automação alinhada a controles humanos estruturados: organizações que implementaram agentes de IA registraram diminuição no tempo de análise de sinistros e redução nas reclamações, mantendo, entretanto, altos níveis de auditoria e revisão manual para situações de maior complexidade.
Porém, a adoção em larga escala passa por dois grandes desafios – modernização de legados e governança. Em muitos mercados, inclusive no Brasil, as seguradoras convivem com sistemas e processos históricos que tornam a integração das novas soluções mais complexa. Modernizar aplicações, expor dados via APIs e estabelecer pipelines de dados confiáveis é pré-condição para que agentes de IA entreguem todo seu potencial – e esse é um investimento que exige priorização estratégica. Segundo pesquisas, é preciso ter atenção para a necessidade de uma “infraestrutura digital” antes de se confiar cegamente em agentes autônomos.
Governança é o outro pilar inegociável. A facilidade com que qualquer time de negócio pode hoje “criar um agente” – em um movimento comparável ao surgimento do Excel como gerador de sistemas alternativos ao da área de IT – impõe que TI e compliance deixem de adotar postura meramente restritiva e assumam protagonismo em regras, frameworks e boas práticas. Definir quem pode treinar modelos, quais dados são permitidos, níveis de autonomia e gatilhos para intervenção humana são decisões que evitam desde vazamento de dados sensíveis até a proliferação de agentes com comportamentos imprevisíveis. A experiência prática mostrada no ITC e em levantamentos sobre escalabilidade da IA Generativa conclui que muitas empresas ainda têm lacunas de preparo e precisam mapear recursos, responsabilidades e expectativas de retorno antes de levar POCs à produção em larga escala.
Um último ponto, que voltou repetidamente nas conversas e painéis, é o da demonstração de valor com cases práticos. A indústria seguradora, naturalmente avessa ao risco, tende a adotar inovações de forma seletiva: quando surge um case que entrega ganhos claros (redução de custo, menor tempo de liquidação, menos fraudes detectadas), a adoção se acelera. Isso explica por que muitas iniciativas permanecem em projeto piloto até que um player renomado prove o ROI de forma transparente. A lição para executivos é dupla: priorizar iniciativas que resolvam dores mensuráveis e, simultaneamente, construir governança que permita escala segura quando o case se provar vencedor.
Como já fizeram em outros setores, os agentes de IA prometem transformar etapas fundamentais do seguro – do underwriting ao sinistro –, entregando ganhos de produtividade, melhores experiências ao cliente e potencial redução de despesas administrativas. Mas o benefício real só aparece quando há visão estratégica, infraestrutura digital e governança robusta.
O futuro não é um cenário de substituição em massa, mas de reconfiguração inteligente de papéis, com o agente de IA como executor e acelerador, o humano como decisor e fiscalizador, e as áreas de TI como guardiãs do modelo e da integridade dos dados. A escolha que as seguradoras têm agora é simples na lógica e complexa na execução: governar bem para automatizar mais, ou automatizar mal e perder a chance de colher o que a IA realmente pode oferecer.
*Paulo Cesar Pissardo é Head of Insurance Brazil (Business Director) da GFT Technologies
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